Pesquisa sobre protofeminismo faz estudante da UFRJ vencer prêmio internacional

Agora, Yasmim Pontes aprofunda estudo, no Canadá

Por Giulia Costa – Fonte: www.ufrj.br

Estudante de Letras na Universidade Federal do Rio de Janeiro e bolsista de Iniciação Científica pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj), Yasmim Pontes foi selecionada para participar de um estágio em pesquisa na Simon Fraser University, em Vancouver, Canadá – frequentemente classificada entre as melhores universidades do país. A seleção veio a partir da conquista do prêmio Mitacs Globalink Research Award, iniciativa realizada pela organização Mitacs.

O interesse pela pesquisa começou desde o início da graduação, mas foi no terceiro semestre do curso que Yasmim iniciou seu primeiro estudo sobre a invisibilidade da literatura lésbica, em 2019. Posteriormente, sob orientação de Nastassja Pugliese, professora da Faculdade de Educação da UFRJ, a estudante iniciou sua pesquisa sobre o protofeminismo no Brasil no século XIX, a imprensa feminista e a filosofia da educação de Nísia Floresta, com a qual venceu a premiação.

A pesquisa

O grupo de pesquisa “Outros Clássicos: História da Filosofia e Educação” é coordenado por Nastassja e sua proposta é resgatar obras de autores e autoras que são pouco estudados e foram esquecidos ao longo da história.

“No momento, nossa pauta mais importante é resgatar obras de mulheres filósofas e fazer um projeto de pesquisa. Como essas autoras foram pouco estudadas, há escassez de literaturas secundárias sobre elas e muitas edições de suas obras são consideradas raras. Nosso projeto envolve um trabalho de arquivo, como ir às bibliotecas, pesquisar, acessar, ler e ensinar essas obras para que elas entrem no diálogo científico nacional e internacional”, destacou Nastassja.

A partir desse projeto de resgate, Yasmim dedica-se a pesquisar sobre a filósofa brasileira Nísia Floresta. Nascida em 1810 no Rio Grande do Norte, a autora foi uma das precursoras do feminismo no Brasil e na América Latina, além de dirigir uma escola para meninas com um currículo progressivo, ensinando aritmética, geografia, dança, música e línguas estrangeiras – o que era uma grande inovação para a época. À frente de seu tempo, Nísia Floresta defendeu ideais políticos que sustentariam uma nação nos princípios da igualdade, como o direito à educação científica para mulheres.

Apesar do importante trabalho realizado pela filósofa, Nísia faz parte de um grande grupo de mulheres que acabaram sendo esquecidas e invisibilizadas ao longo da história. Com isso, Yasmim está empenhada em um denso trabalho de recuperação de suas obras a fim de proteger o legado e a memória da autora no ambiente digital.

“Tenho passado muito tempo pesquisando sobre imprensa no site da Biblioteca Nacional, olhando todos os jornais e resgatando tudo o que encontro sobre Nísia Floresta. Posteriormente, quero pesquisar sobre outras mulheres, mas nesse momento meu foco principal é a Nísia. Tenho coletado esses materiais que estão um pouco desconectados, juntando todos e formando um trabalho a partir disso”, explicou Yasmim.

Yasmim já está em estudos no Canadá | Foto: Arquivo pessoal

Nastassja explica a importância do trabalho realizado pela orientanda. “Digitalizar textos antigos e raros é muito importante para podermos propiciar para as próximas gerações o acesso a essas obras de modo mais fácil, pois evita que essas grandes mentes brasileiras sejam esquecidas, o que só reforçaria nosso estigma de subdesenvolvidos e dependentes. As humanidades digitais têm esse efeito de reconhecimento da nossa produção intelectual e da manutenção de um legado”, declarou.

A docente destaca, ainda, os benefícios desse feito para a Universidade. “Este é um projeto muito importante, pois põe a UFRJ em diálogo com essas universidades estrangeiras, sendo responsável pela internacionalização, preservação e divulgação de um legado de uma intelectual brasileira. Ele reflete o efeito da importância da digitalização nas pesquisas em ciências humanas”, continuou.

Yasmim comemora e deseja que outros estudantes também possam usufruir dessa oportunidade.

“Faz uma semana que estou no Canadá, ainda desacreditada de que estou aqui para fazer pesquisa. O investimento é visível: quando entrei na biblioteca pela primeira vez, me emocionei. Infelizmente, os alunos encontram muitas dificuldades para realizar pesquisas no Brasil, e não deveria ser assim. Acredito que todos os que querem trabalhar com isso deveriam ter a oportunidade de ir para uma universidade estrangeira, principalmente para testemunhar a diferença entre uma nação que tem grandes incentivos à pesquisa científica e uma que não tem tantos, como a nossa”, disse.

A orientadora parabenizou a aluna e compartilhou do mesmo desejo de ampliação de oportunidades para os brasileiros, lembrando a importância do investimento em iniciação científica para o ambiente acadêmico e para a sociedade. “Eu tenho muito orgulho dela [da Yasmim Pontes], da sua capacidade de pesquisar e de construir um trabalho maravilhoso. Ela é capaz de realizar contribuições em qualquer lugar, qualquer que seja o estudo. Por outro lado, o feito da Yasmim não deveria ser tão raro, pois nós temos uma grande quantidade de alunos que poderiam contribuir para a ciência brasileira, mas não conseguem por falta de recursos. É muito importante que a história dela estimule as universidades a investirem em pesquisa, pois este é um exemplo de que existe pesquisa de qualidade no Brasil que é reconhecida internacionalmente”, afirmou.

A pesquisadora Nastassja Pugliese é docente da Faculdade de Educação da UFRJ | Foto: Arquivo pessoal

O prêmio

Desde 1999 o Mitacs Globalink Research Award é uma iniciativa que visa premiar jovens graduandos de diversos países com uma bolsa para passar de 12 a 24 semanas no Canadá, conduzindo pesquisas sob a orientação de professores canadenses. Além do Brasil, a premiação abrange uma variedade de nações, como os Estados Unidos, Japão e China. Como prêmio, Yasmim recebeu a oportunidade de desenvolver sua pesquisa por quatro meses na Simon Fraser University, com pesquisadores nativos.

Este texto é resultado das atividades do projeto de extensão “Laboratório Conexão UFRJ: Jornalismo, Ciências e Cidadania” e teve a supervisão do jornalista Victor França.