Coordenação de Ações Afirmativas e Diversidade amplia a discussão sobre equidade na UFRJ
Por Vanessa Almeida e Julia Mendes – Fonte: www.ufrj.br
A luta para tornar a Universidade e a sociedade locais mais diversos e justos ganhou um novo passo. A Coordenação de Ações Afirmativas e Diversidade da UFRJ foi criada por meio da Portaria nº 2.037, de 13 de março de 2023. O novo setor é responsável pela maior inserção do diálogo sobre políticas públicas raciais e de outras minorias no ambiente acadêmico que corrijam diferenças sociais e garantam direitos previstos em lei.
Quem circula pela UFRJ pode perceber as mudanças que vêm acontecendo há alguns anos. Às vezes devagar, outras com a pressa que o momento social exige, a Universidade está mudando. Mudança essa que nem sempre foi um ponto consensual, já que o sistema de cotas raciais para ingresso dos alunos na graduação da instituição foi aprovado apenas em 2014, dois anos após a aprovação da Lei nº 12.711, conhecida como Lei de Cotas.
Para que a Universidade se torne um espaço mais plural e diverso e represente a sociedade brasileira como ela realmente é, as práticas institucionais que pensem políticas públicas e as ações afirmativas têm sido primordiais.
A caminhada de muitos para que sejamos cada vez mais diversos
O que hoje integra a estrutura da Universidade como a Coordenação de Ações Afirmativas e Diversidade teve início em 2018, por meio da Câmara de Políticas Raciais, e em 2019 passou a atuar sob a alcunha de Comissão de Aferição, especialmente em relação às denúncias de fraudes nas vagas destinadas às cotas. O grupo, formado inicialmente por 32 pessoas, realizou cerca de 3 mil aferições. Em 2019 foi constituída a Câmara de Políticas Raciais. A partir de demandas dos coletivos negros da Universidade, iniciou-se o entendimento de que era necessário barrar as possibilidades de fraudes na via de entrada na universidade – e não na saída.
“A grande reivindicação dos coletivos universitários negros era a heteroidificação no acesso à graduação. Não adiantava fazer um trabalho em relação às fraudes, se a porta ainda continuava aberta para isso. Era necessário esse controle social”, declara Denise Góes, que divide a coordenação de Ações Afirmativas e Diversidade com Cecília Izidoro.
A partir de 2020, foram constituídas as comissões de heteroidentificação no ingresso à graduação, com o objetivo de garantir o direito de acesso às políticas públicas a quem realmente o detém. No caso da graduação, a Lei nº 12.711/2012 estabelece que 50% das vagas nas universidades federais por curso e turno sejam reservadas para estudantes que tenham cursado o ensino médio integralmente em escolas públicas. Dentro dessas vagas, encontra-se a reserva para pretos, pardos e indígenas e pessoas com deficiência, de acordo com a proporção da população do estado em que esteja instalada a instituição de ensino.
A Coordenação de Ações Afirmativas e Diversidade também realiza formações por meio de cursos para toda a comunidade universitária, no intuito de contextualizar a realidade racial em que o processo de heteroidentificação é realizado. Relações raciais, identidade negra, raça, etnia, racismo, etnocentrismo, preconceito racial, democracia racial, branquitude e assédio racial foram temas trabalhados na última turma, que aconteceu em março deste ano e capacitou 96 pessoas, entre técnicos-administrativos, professores e estudantes. Os que completam o curso estão aptos a participar da comissão de heteroidentificação, além de adquirirem conhecimentos que os tornam capazes de aplicar a luta antirracista também em suas realidades, comunidades e vivências.
A atuação na sociedade
A atuação da Coordenação de Ações Afirmativas e Diversidade não se dá apenas dentro dos muros da UFRJ. Com a pauta racial como um dos principais focos do atual governo, a Coordenação busca estabelecer diálogos frequentes com o Ministério da Igualdade Racial e o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, visando aumentar cada vez mais a formulação de políticas públicas voltadas para a inclusão de minorias na Universidade. Segundo Denise, estabelecer uma interlocução institucional forte com instâncias do governo é primordial para a sustentabilidade dessas políticas no meio acadêmico.
“Os objetivos para o futuro se dão em construir uma Universidade plural. E onde é que se localiza a pluralidade? Na ocupação de espaço. Não se pode falar em pluralidade quando, em todos os cargos de chefia, não há negros ou mulheres, por exemplo. Nós precisamos verdadeiramente desse espaço mais democrático. Precisamos ocupar espaços e, aí sim, ter uma universidade mais plural.”
E não para por aí. A luta da temática racial na sociedade – e que se reflete na UFRJ –impôs a necessidade de uma estrutura maior, e a atual Administração Central apoiou a criação de uma superintendência. Assim, segundo Denise, o órgão terá ainda mais abrangência, tanto interna quanto externamente. “Nós fizemos essa relação institucional ficar mais forte por meio da nossa atuação irretocável de responsabilidade, de compromisso e de seriedade. Então todos esses elementos fizeram com que a gente ganhasse espaço. Para nós, o importante é ter esse caráter institucional que nos permite falar em nome da UFRJ para a sociedade, outras universidades ou qualquer outro órgão.”
Mais do que alcançar um espaço cada vez maior na Universidade, a Coordenação de Ações Afirmativas e Diversidade busca pertencer a ele. Por isso, Denise enfatiza que umas das prioridades do novo órgão é o diálogo direto com os estudantes, docentes e coletivos para pensar as atividades da coordenação. Segundo ela, a pandemia gerou um distanciamento entre esses grupos e, por consequência, uma desarticulação dos movimentos sindical e estudantil.
“Estamos pensando em realizar um seminário interno, mas antes precisamos discutir com as lideranças desses coletivos de que formas podemos voltar a ter uma atuação mais ativa e mais impactante no ambiente acadêmico.”
A palavra “diversidade” não aparece no nome da Coordenação por acaso. Para além da questão racial, o setor também busca fomentar políticas públicas voltadas para demais minorias, como mulheres, comunidade LGBTQIA+, pessoas com deficiência, entre outros. Segundo Denise, a proposta da Coordenação é fortalecer esses diversos atores sociais que têm em comum um fator emergencial: a histórica invisibilidade, tanto no meio acadêmico quanto na sociedade em geral.
A Coordenação também é responsável por acolher os candidatos que adentram a instituição por meio de cotas e demonstrar a eles que não se trata apenas de dizer se são aptos (ou não) à utilização do mecanismo, mas também fazê-los entender o seu papel no meio universitário.
“Reunimos os novos estudantes no auditório e falamos sobre a importância da política pública, sobre os critérios fenotípicos, da luta do movimento negro, da meritocracia, do racismo, da importância dessa política pública e por que ela foi criada. E você percebe pelo brilho do olho daquela pessoa que ela se sente representada, e ainda pedimos que essas pessoas reproduzam isso onde forem. Essa política pública não é mérito, é lei – e lei precisa ser cumprida.”