Mutações como a ocorrida no Amazonas causam aumento de casos e mortes, além de deixarem o sistema de saúde mais próximo do colapso
Por Carolina Correia
Os vírus estão em constante mutação–sempre que se replicam, mudanças podem ocorrer em sua estrutura. A cada mês, estima-se que o Sars-Cov-2, vírus responsável pela pandemia da COVID-19, sofra de três a quatro mutações. Variantes surgidas ao redor do mundo, atualmente, vêm preocupando especialistas e governantes por causarem um aumento significativo da taxa de contágio.
Na última semana, o Amazonas, principalmente a capital Manaus, assistiu ao colapso de seu sistema de saúde, com o fim dos estoques de oxigênio e medicamentos, e do sistema funerário. Com um aumento de quase 200% no número de mortes diárias, o estado é o foco de uma das cepas mais contagiosas do vírus. Identificada inicialmente no Japão em pacientes que viajaram ao Brasil, o vírus originário da região manauara pode ser mais contagioso que seu antecessor e estar relacionado, também, ao primeiro caso de reinfecção comprovado no Amazonas.
Para Alberto Chebabo, médico infectologista e diretor da Divisão Médica do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho (HUCFF), a variante amazonense é diferente das descritas em outras partes do mundo, mas aparenta ter a mesma alteração, o que pode justificar o aumento da transmissibilidade. “Essa mutação é em relação ao spike, região preservada do coronavírus, e, dessa maneira, provavelmente também é mais transmissível. Mas essa variante também traz mudanças específicas, com alterações que não foram descritas em outras cepas.”
As duas variantes similares à de Manaus foram encontradas no Reino Unido e na África do Sul. Detectada em novembro de 2020, a cepa VOC 202012/01 se tornou a principal causadora entre as infecções na região de Londres, com notificação em mais de 40 países, entre eles o Brasil. A variante sul africana 501.V2, descoberta em outubro, já foi notificada também na França e no Reino Unido. “Ainda fazemos pouco sequenciamento genético no país, então temos uma capacidade muito pequena de detectar essas mutações. É possível que elas já estejam circulando aqui e não saibamos.”
O infectologista explica que as mutações são comuns aos coronavírus, acontecendo de maneira aleatória durante todo o ciclo de transmissão.
“Elas ocorrem ao acaso e podem levar vantagem ou desvantagem em relação a suas cepas originais, como uma maior taxa de contágio ou um gasto maior de energia. No caso das variantes do Reino Unido, da África do Sul e de Manaus, essa mutação causou a ‘vantagem’ de ser mais transmissível”, conta Chebabo.
A transmissibilidade é a maior preocupação dos especialistas: a cepa britância, por exemplo, pode ser de 50 a 70% mais transmissível que a original surgida em Wuhan, na China, em 2019. “Isso significa um número maior de casos e, consequentemente, de casos mais graves. Além disso, é uma uma cepa que pode, com algumas poucas mutações, se tornar resistente aos anticorpos produzidos pela vacina” afirma.
A boa notícia é que, até o momento, não há indicativos de que as cepas mais transmissíveis sejam resistentes à vacina, já que as mutações não alteraram de forma significativa as partes do vírus que são atacadas pelos imunizantes.
“A vacina produz anticorpos contra porções específicas que não sofreram mutações de maneira muito expressiva a ponto de diminuir a afinidade dos anticorpos da vacina pelo vírus, mas é possível que isso possa acontecer no futuro,” conclui o pesquisador.
O aumento de casos e o surgimento de novas variantes mostram, principalmente, que os cuidados frente ao vírus devem continuar sendo observados e seguidos. O isolamento social, uso de máscara e de álcool em gel ainda são as melhores formas de proteger a si mesmo e os outros.
Fonte: www.ufrj.br