Ciência (e a vacina) brasileira em risco

Cortes orçamentários na cota de importação do CNPq criam cenário dramático para a ciência brasileira

Por Victor França – Fonte: www.ufrj.br

Além dos cortes orçamentários, outra medida do governo federal ameaça inviabilizar diversos projetos científicos no país: a redução de quase 70% na cota de que o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) dispõe para importação de insumos de pesquisa livres de impostos. O corte coloca em risco até mesmo o desenvolvimento de uma vacina brasileira contra a COVID-19.

Pesquisadores brasileiros têm menos de um terço do que tinham no ano passado em cota para importação de insumos de pesquisa livres de impostos | Arte: Victor França (Coordcom/UFRJ)

Em 2020, o valor da cota foi de US$ 300 milhões. Em 2021, o montante aprovado no orçamento da União caiu para US$ 93 milhões. A redução da cota de importação tem efeito cascata sobre todo o sistema de ciência e tecnologia nacional, já que todas as isenções de impostos precisam ser aprovadas pelo CNPq, mesmo que as pesquisas não contem com financiamento.

Para Fernando Peregrino, diretor-executivo da Fundação Coppetec, o erro vem desde o Projeto de Lei Orçamentária Anual (Ploa). “Ela [a cota de importação] já veio do governo federal com menos de um terço do que era antes. Eles se basearam em critério arbitrário, ignorando a série histórica. Desde janeiro, o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI) tem tentado negociar com o Ministério da Economia. O caos orçamentário é bem conhecido da sociedade”, assevera.

Vacina brasileira ameaçada

De acordo com Peregrino, o CNPq credencia os projetos selecionados da isenção fiscal, mas as fundações de apoio não têm conseguido as licenças de importação pleiteadas.

Ao todo, 15 processos de importação intermediados pela Fundação Coppetec estão parados. A vacina brasileira está ameaçada. Qualquer uma das 10 vacinas que estão cotadas, dentre elas a da UFRJ, está sob ameaça. O impacto é generalizado em todos os campos da ciência.

Fernando Peregrino, diretor-executivo da Fundação Coppetec

Segundo o diretor da Coppe/UFRJ, professor Romildo Toledo, a medida impacta as pesquisas que já estão em desenvolvimento na Universidade. “O corte promovido pelo governo afeta projetos acadêmicos e com a indústria que estão em andamento, já que prejudicará a aquisição de insumos e equipamentos que serão essenciais para sua continuidade e conclusão. Isso afetará, portanto, projetos de mestrado e doutorado e também de pesquisa, desenvolvimento e inovação”, destaca.

É um efeito cascata que compromete, em médio e longo prazos, o próprio futuro do país.

Romildo Toledo, diretor da Coppe/UFRJ

Na análise do diretor-superintendente da Fundação Coppetec, professor Antonio MacDowell de Figueiredo, mesmo levando em conta as dificuldades do país, a redução da cota mostra a incompreensão da importância que a pesquisa científica e tecnológica tem para o desenvolvimento socioeconômico do Brasil.

A medida pode levar à interrupção de um conjunto enorme de projetos que têm nessas importações um elemento essencial. Significa perda da possibilidade de cumprir acordos e cronogramas assumidos. É um prejuízo que se projeta no futuro, tem efeitos em curto e longo prazos.

Antonio MacDowell de Figueiredo, diretor-superintendente da Fundação Coppetec

De acordo com Figueiredo, a medida prejudica a cooperação com laboratórios e pesquisadores de fora do país e a confiança estabelecida entre as partes de que o Brasil e suas instituições têm condições de cumprir acordos estabelecidos. “Além disso, afeta a pesquisa de vanguarda, na fronteira do conhecimento, pois se trata de insumos, materiais e equipamentos que não estão disponíveis na indústria brasileira”, critica.

“Estamos mobilizando as entidades representativas do setor e falei com o ministro Marcos Pontes na última quinta-feira, 10 de junho. Ele me informou que remeteu novo ofício ao Ministério da Economia, tratando sobre o tema”, relata Peregrino, que também é presidente do Conselho Nacional das Fundações de Apoio às Instituições de Ensino Superior e de Pesquisa Científica e Tecnológica (Confies).

Da Coppe/UFRJ.