Interrupções no fornecimento ameaçam ensino, pesquisa e extensão e criam insegurança nos campi
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O histórico edifício Jorge Machado Moreira (JMM), que abriga uma série de órgãos técnicos da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), além da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) e da Escola de Belas Artes (EBA), e que, por décadas, sediou a própria Reitoria da Universidade, amanheceu nesta quarta-feira, 13/11, às escuras. O motivo foi o corte de energia elétrica imposto pela concessionária no fim da tarde anterior. No lugar das atividades administrativas, de ensino, pesquisa e extensão, o espaço foi palco de indignação: representantes da Reitoria, do Sindicato dos Trabalhadores em Educação (Sintufrj), da Associação dos Docentes (Adufrj) e do Diretório Central dos Estudantes (DCE) , em uma aula aberta, condenaram o descaso com a universidade pública, que culminou nos cortes.
O reitor da UFRJ, Roberto Medronho, apresentou um panorama do posicionamento estratégico da Universidade no desenvolvimento do país, bem como dos constantes cortes no orçamento da instituição. “Neste prédio que estamos, se faz ensino, pesquisa e extensão de qualidade. Aqui se formou Portinari. Aqui se formou Oscar Niemeyer. Como pode este prédio estar sem luz?”, lembrou o reitor, ao destacar também que atualmente quase 60% dos alunos de graduação da UFRJ são oriundos de ações afirmativas – cotas étnico-raciais e socioeconômicas. “Muitos desses alunos, se a UFRJ parar, não conseguirão se formar”, alertou.
Também foi expressa a indignação pelos espaços que foram objeto de tentativa de corte, ou onde o corte foi efetivamente feito. Na noite de terça-feira, 12/11, a concessionária tentou cortar a energia de espaços fundamentais para a assistência aos estudantes em vulnerabilidade socioeconômica: o Restaurante Universitário (RU), onde são servidas cerca de 9 mil refeições subsidiadas pela Universidade; a residência estudantil, onde moram 500 alunos da UFRJ; e a iluminação pública e de segurança nas vias da Cidade Universitária, afetando os alunos dos cursos noturnos, em sua maioria trabalhadores.
Na tarde de quarta, a concessionária de água cortou o fornecimento em diversos pontos do campus, entre eles justamente o RU e a residência estudantil. “Além de uma atitude arbitrária por parte das concessionárias, é uma atitude cruel com os mais vulneráveis”, afirmou Medronho.
A indignação da administração central foi acompanhada pelas representações de todos os segmentos do corpo social da UFRJ: docentes, técnicos administrativos e estudantes. Ao fim da matéria, veja vídeo com falas completas de todos os segmentos que participaram da aula pública.
Entenda
O Governo Federal repassa às universidades os recursos do chamado orçamento discricionário, ou seja, aqueles que devem ser utilizados para manutenção e investimentos. É com esse valor que são pagos, por exemplo, os fornecedores de alimentação do Restaurante Universitário (RU), as bolsas de assistência estudantil, empresas de segurança patrimonial e manutenção predial e fornecedores, entre eles, os de água e energia elétrica.
Desde 2012, esse orçamento discricionário vem sendo constantemente reduzido, caindo de R$ 784 milhões naquele ano para apenas R$ 392 milhões em 2024, em valores corrigidos pelo IPCA. Estima-se que apenas para pagar os valores de custeio e parcelas de dívidas seriam necessários R$ 743,9 milhões anuais, isso sem considerar a recuperação da infraestrutura ou novos investimentos.
Neste cenário, a gestão da Universidade precisa tomar decisões difíceis como, por exemplo, decidir entre cortar as bolsas ou atrasar as contas de luz. E cresce também o endividamento: as despesas não pagas em um ano ficam para o ano seguinte. Em 2023, a UFRJ fechou o ano com uma dívida de custeio de R$ 176 milhões. A expectativa é que esse valor alcance R$ 192 milhões em 2024.
Dessa forma, acumularam-se os débitos da concessionária de energia elétrica, que alcançaram R$ 31,8 milhões, e representam as faturas de maio a novembro, além de mais R$ 3,9 milhões em acordos sobre dívidas de exercícios anteriores. Com a companhia de água, os débitos são de R$ 18 milhões. Convém ressaltar que os altos gastos de energia e água são fruto principalmente das pesquisas científicas de excelência que a Universidade produz, com equipamentos que demandam alto consumo.
Ao longo deste período, a UFRJ tem negociado de forma constante com seus fornecedores, reconhecendo as dívidas e buscando uma maneira de solucionar os pagamentos sem a interrupção nos serviços. Em paralelo, vem sendo demandada suplementação orçamentária ao Ministério da Educação (MEC), para que os acordos de pagamento possam ser honrados.
Apesar da negociação, as empresas têm insistido – na justiça, inclusive – na interrupção do fornecimento de água e luz, como forma de pressionar a Universidade. “Entendemos que esse é um corte ilegal, pois a decisão judicial obriga a concessionária a manter o fornecimento em locais onde são realizadas atividades essenciais: o ensino e a pesquisa são atividades essenciais”, declarou Medronho.
Justiça
No início da noite de quarta-feira, 13/11, a UFRJ por meio da Procuradoria da Universidade e da Procuradoria Regional Federal (PRF2), conseguiu na Justiça suspender os cortes de energia elétrica que vinham sendo efetuados em unidades da Universidade pela concessionária.
Na decisão, o desembargador Alcides Martins determinou que a “Light se abstenha de interromper o fornecimento de energia nas instalações” da UFRJ e faça o religamento imediato nas instalações que sofreram corte de luz.
A decisão levou em consideração o caráter essencial das atividades acadêmicas e de assistência oferecidas pela UFRJ.