Projeto da Poli busca redução de risco de deslizamento de terra por meio de ações socioeducativas
Por Carol Correia – Fonte: www.ufrj.br
O verão chega e as cenas se repetem: as chuvas torrenciais da estação causam deslizamentos de terra e deixam famílias em perigo. Para enfrentar esse problema ambiental crônico, prejudicado por décadas de políticas públicas ineficientes, o Encosta Viva, coordenado pela Escola Politécnica (Poli), aposta na educação.
Criado em 2010, o projeto de extensão e pesquisa investe em ações socioeducativas para redução de riscos e desastres associados a deslizamentos de terra. Por meio da troca de saberes entre a população, a Universidade e os gestores públicos, a iniciativa busca fomentar a participação dos diferentes grupos na gestão de risco.
Marcos Barreto de Mendonça, professor da Poli e coordenador do projeto, conta que a ideia nasceu a partir de um edital da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj) que pesquisava metodologias educativas de redução de risco em desastres, incluindo a aplicação experimental de um projeto piloto no Morro do Bumba, severamente afetado por um deslizamento de terra em 2010. A partir daí, as ações passaram a acontecer em escolas, comunidades e museus.
“O projeto tem a finalidade de criar um campo de divulgação científica e discussão, entre diferentes atores envolvidos na questão, possibilitando a troca de saberes relacionados aos aspectos técnicos e sociais do tema. Ao mesmo tempo, esses processos educativos são objetos de pesquisa para se chegar à proposição de metodologias de ações educativas sobre essa temática. O objetivo final é fomentar o engajamento efetivo da sociedade nas ações de redução de riscos”, explica Mendonça.
Entre as atividades desenvolvidas, estão oficinas educativas e rodas de conversa em escolas, museus e associação comunitárias. Um dos maiores parceiros da iniciativa é o Espaço Ciência Viva, museu interativo no Rio de Janeiro, que tem uma larga experiência em divulgação científica. Lá são realizadas atividades de construção de ferramentas pedagógicas e treinamento de mediadores.
O museu abrigava, também, até o início da pandemia, o evento mensal Sábado da Ciência. Mendonça conta que durante a crise da covid-19 o projeto de extensão se concentrou na produção de um espaço chamado Casa dos Deslizamentos, que será dedicado ao tema. “Após a abertura das escolas para as atividades presenciais, nós realizamos, em outubro de 2021, uma campanha de oficinas educativas com 534 crianças e adolescentes de 30 turmas da educação inicial até o 9º. ano de duas escolas municipais do Rio de Janeiro”, conta.
Educação transformadora
Mendonça acredita que a educação para redução de risco é um trabalho que deve ser realizado a todo momento, mesmo que os frutos só sejam coletados ao longo do tempo com a criação de uma cultura sobre o tema. Entre os principais ganhos, estão a minimização das ações humanas resultantes da forma de ocupação do terreno que potencializam a suscetibilidade a deslizamentos; o conhecimento sobre o que é e onde estão as áreas de risco; o treinamento sobre como agir em uma situação de emergência; a criação de grupos comunitários voltados para melhorar as condições locais quanto ao perigo dos deslizamentos e, também, a conscientização de que, para reduzir os riscos, precisamos da participação de todos e não só do Estado.
“Os novos saberes devem ser apreendidos por todos os atores e não só pela população moradora de áreas de risco. Temos que exercitar a troca de saberes através da interatividade das atividades educativas. Nós, os acadêmicos, e os gestores públicos temos muito a aprender com a população”, afirma o pesquisador.
Falta política pública
Chuvas intensas acontecem todos os anos, fazem parte da natureza, e a ocorrência de desastres associados a elas já não deveriam mais surpreender o poder público. Áreas de risco são muito comuns em muitas cidades do Sudeste, Sul e na costa leste do Nordeste. A ciência segue evidenciando que, com o aquecimento global, a situação tende a ficar mais grave, com eventos extremos de chuva, principalmente no Sudeste.
Segundo o professor, não é possível culpar a chuva, mas sim a forma de ocupação do solo, questionando as principais razões da ocupação de encostas pelo homem, que, além de potencializar a suscetibilidade destes terrenos aos deslizamentos, expõe grande parte da população, principalmente a mais pobre, ao risco.
“A primeira coisa que falta, por parte do poder público e da sociedade civil, é uma visão ampla do problema, uma visão que identifique os aspectos físicos e sociais subjacentes ao risco. É muito comum se fazer, de forma equivocada, um recorte temporal, espacial e setorial limitado do desastre e as medidas pensadas acabam tendo um efeito muito limitado. Não basta pensar em obras de engenharia para diminuir a ocorrência de deslizamentos, elas estão longe de dar conta do problema. Precisamos de políticas públicas de habitação, de preservação ambiental, de educação para redução de riscos, de monitoramento de riscos, de capacitação profissional especializada do pessoal da gestão pública, entre outras”, conclui.
Conheça o site do projeto.