Mostra de Teatro da UFRJ: dirigir para performar

Com mais de um mês de apresentações, evento reúne projetos de conclusão de curso de alunos de Direção Teatral

Por Tassia Menezes e Vitória Miranda – Fonte: www.ufrj.br

Quando se pensa em graduação na área de Comunicação, vêm logo à mente seus cursos mais tradicionais, como Jornalismo e Publicidade. No entanto, na Escola de Comunicação (ECO) da Universidade Federal do Rio de Janeiro, também é possível estudar Rádio e TV, Produção Editorial e Direção Teatral. Esse último, com a entrada de apenas 15 estudantes por ano letivo, existe desde 1994. Neste ano realiza a XXII Mostra de Teatro da UFRJ, evento que ao mesmo tempo é o projeto de formatura dos alunos e um modelo de integração entre cursos e instituições.

Com mais de um mês de apresentações, a mostra iniciou sua programação em 11/11 e segue até 17/12. Ao longo de mais de um mês, dezesseis espetáculos reúnem, na Sala Vianninha, no Palácio Universitário, os trabalhos dos alunos de Direção Teatral, um projeto de encenação dos estudantes do Colégio de Aplicação (Cap) da UFRJ e uma apresentação curta dos estudos de Shakespeare.

Como é um evento de grandes proporções, a mostra deste ano contou com a parceria da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio) e outros cursos da UFRJ, já que cada equipe possui, no mínimo, 10 pessoas de diferentes funções. Alunos do curso de Artes Cênicas da Unirio participam como atores das apresentações e ganham horas complementares. Já os de Cenografia e Indumentária da Escola de Belas Artes (EBA) e de Dança da Escola de Educação Física e Desportos (EEFD) da UFRJ recebem horas de extensão como retorno de participação. A diretora também costuma convidar outros interessados em participar.

Érika Neves é a coordenadora de Produção do evento há 14 anos, mesmo período em que está no cargo de produtora cultural na Universidade. Ela conta que muitos dos espetáculos que se originam na mostra se desenvolvem em outros palcos e telas depois, entrando em circulação por teatros, ganhando editais ou sendo repensados para o cinema ou demais formatos. Érika reforça que um dos pontos positivos da mostra é a união entre os estudantes, com a formação de coletivos artísticos, inclusive para além do teatro.

A arte como sobrevivência e denúncia

O espetáculo Manual de Sobrevivência do Preto, de Alberta Juliana e Mayara Liriano, com poema de Victoria Santa Cruz e trecho do filme Hair, é autoral e foi pensado para a formatura e a mostra. Apresentado nos dias 25 e 26/11, é resultado da mudança no perfil dos alunos da instituição, levando corpos pretos para o palco e seus bastidores. Ao acompanhar a apresentação, o Conexão UFRJ pôde ver como a obra provocou o público ao dar voz aos acontecimentos do cotidiano que denunciam a existência do racismo estrutural e enraizado que persiste no Brasil do século XXI.

Homem negro veste roupa branca e carrega arma na cintura e bandeira do Brasil no ombro.
Espetáculo Manual de Sobrevivência do Preto, dirigido por Alberta Juliana. | Foto: Giuliana Falci (Divulgação)

Em Manifesto Preto, texto de apresentação do espetáculo, a diretora Alberta Juliana reforça que a peça foi escrita justamente com o desejo de trazer esses corpos para a cena, contando suas histórias, levando ao palco artistas pretos, oriundos de diversos locais periféricos. “Esses artistas conduzem a plateia ao questionamento sobre esses padrões sociais segregacionistas e o lugar destinado ao corpo negro dentro da sociedade. A dramaturgia leva o público a refletir sobre as barreiras impostas pelo racismo e pela intolerância, uma vez que esses preconceitos já se tornaram culturais devido à estrutura da nossa sociedade”, explica ela.

O espetáculo nasce da dor, da luta e do autoconhecimento de quem enfrenta o racismo, com o sonho em comum de todas as pessoas pretas: sobreviver. Em uma das cenas, por exemplo, é demonstrado como desde cedo as crianças são ensinadas a se comportar diante de uma abordagem policial.

O foda é que a gente não tá sonhando coisa difícil não, preto. Eu não tô sonhando que viro um mágico ou que tenho superpoderes, sabe? Eu só tô sonhando que fico vivo.

Fala do espetáculo Manual de Sobrevivência do Preto

Nesse ponto, há um entrelaçamento com outra obra acompanhada. A Paz, comédia grega escrita por Aristófanes em 421 a.C., foi adaptada por Anna Padilha para o Brasil atual, onde existem políticos que, literalmente, comem merda e alguns poderosos que observam enquanto submissos lutam pela tão sonhada paz. A diretora do espetáculo revela que escolheu a obra por não ver melhor forma de tratar de um tema tão importante e recorrente em pleno século XXI. “Depois de passarmos pelo evento catastrófico que foi a pandemia, a comédia é o melhor remédio para as dores do cotidiano, pela sua habilidade em discutir assuntos sérios, provocando no espectador, ao mesmo tempo, o riso e a reflexão”, diz.

Ator veste túnica marrom e segura um lenço, ele tem um olhar apreensivo direcionado ao horizonte.
Espetáculo A Paz, dirigido por Anna Padilha. | Foto: Ana Marina Coutinho (SGCOM/UFRJ)

Entre a peça mais antiga e a mais recente da mostra, encontramos a busca por repensar estruturas, já que, assim como sobreviver, a paz é um sonho geral há milhares de anos. Com a coordenação técnica de José Henrique Moreira, a Mostra de Teatro da UFRJ é muito mais do que um projeto pedagógico e artístico. É uma proposta de integração. Com entrada franca, é uma possibilidade de a Universidade levar a arte não só a alunos e servidores, mas também para pessoas de fora da instituição.

 

Serviço

Data: 11/11 a 17/12

Local: Sala Vianninha (Escola de Comunicação da UFRJ − Av. Pasteur, 250)

Entrada Franca: distribuição de senhas uma hora antes de cada apresentação − sujeito a lotação

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