Pesquisadores do Centro de Ciências da Saúde (CCS) analisaram situação dos beneficiados e do sistema de saúde brasileiro entre 2020 e 2021
Por Carol Correia – Fonte: www.ufrj.br
Uma pesquisa realizada pelo Instituto de Estudos em Saúde Coletiva (Iesc) e pela Faculdade de Medicina (FM), atualmente em revisão na revista Scientific Reports, indicou que os programas sociais de transferência de renda foram essenciais durante o período crítico da covid-19. Investigação também ressaltou que a população negra teve um maior índice de mortalidade no mesmo recorte temporal.
O estudo, que analisou dados de contágio da doença colhidos entre março de 2020 e setembro de 2021 em todo o Brasil, detectou uma relação inversa entre as taxas de mortalidade e infecção e o número de pessoas de uma mesma família que eram beneficiárias de algum dos programas governamentais.
Segundo Roberto Medronho, professor da FM e um dos autores do artigo, a hipótese discutida pelo grupo é de que, com a segurança dos benefícios, os usuários evitaram de se expor em busca do sustento, mantendo o devido isolamento social. Quanto mais pessoas de um mesmo núcleo familiar estavam asseguradas pelos programas, menos chances o vírus tinha de atingir suas residências.
“A transferência de renda permitiu que as pessoas ficassem mais em casa se protegendo de pegar e morrer de covid. Encontramos que, nos municípios com maior quantidade per capita de famílias beneficiadas pelo Bolsa Família e Auxílio Emergencial, esses índices foram menores”, explica o docente, ressaltando que o trabalho se baseia em um nível municipal – ou ecológico –, e não individual.
Outra descoberta surpreendeu os pesquisadores: em munícipios com uma população com maior cobertura de planos de saúde privados, as notificações de contágio foram maiores, mas isso não se refletiu em um menor número de mortes.
“A gente espera que em grupos com maior acesso ao atendimento de saúde a mortalidade seja menor, mas isso não aconteceu. Infelizmente não tivemos acesso a dados individuais para analisar se as fatalidades foram maiores no serviço privado ou público”, conta.
O trabalho também reforçou um dado já apontado por outros institutos, pesquisadores e ativistas, como a própria UFRJ e a Anistia Internacional: a população preta e parda foi muito mais afetada que a população branca, e isso não tem apenas relação com classe social.
Os municípios que tinham maior proporção de pessoas alfabetizadas e uma renda média semelhante, mesmo que alta, tiveram 45% mais mortalidade entre pretos do que brancos. De acordo com o professor, o cenário é um reflexo da formação histórica do Brasil, com uma sociedade altamente escravocrata e discriminatória.
“Para mim, isso é uma forte evidência de que pessoas com o mesmo nível de escolaridade e renda podem sofrer dificuldades de acesso aos mesmos tratamentos diferenciados apenas pela cor de sua pele. Ou seja, o racismo estrutural mata.”
Além dos benefícios sociais, o Sistema Único de Saúde foi outro fator determinante para ajudar a população durante a crise: sem ele, o número de óbitos e de vítimas da doença seria muito maior.
Os pesquisadores afirmam que parte das políticas públicas foram essenciais para diminuir o impacto da enfermidade, mas que a falta de investimento e de ampliação das campanhas contribuiu para o cenário de tragédia. Estratégias de testagem em massa, isolamento de casos positivos, valorização dos imunizantes e defesa de medidas não farmacológicas poderiam auxiliar no combate ao vírus.
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